O QUE QUEBRA O CORREIOS É A CONCORRÊNCIA DESLEAL E AS POLÍTICAS NEOLIBERAIS
Em entrevista recente ao Podcast Manhã Brasil, do canal Farol Brasil, apresentado por Mauro Lopes, o Secretário-Geral do SINTECT-RS, Alexandre Nunes, fez uma análise profunda e contundente sobre a crise que atinge os Correios. Suas falas escancaram a falta de investimento, o avanço da pejotização e as medidas do próprio governo que vêm fragilizando a estatal, colocando em risco não apenas os empregos, mas a função social e estratégica da empresa pública.
“Negociar com a empresa em crise virou rotina”
O dirigente iniciou sua fala destacando que os trabalhadores dos Correios estão em plena campanha salarial, mas que, mais uma vez, a direção da empresa usa o discurso de “caixa no vermelho” para negar avanços. “Nós, do sindicato, já estamos acostumados a negociar com a empresa em crise. O discurso é sempre o mesmo: não há dinheiro. Mas o problema vai muito além dos números, o que vivemos hoje é um baixo fluxo postal histórico, algo inédito para nós, e resultado direto de decisões políticas e econômicas tomadas nos últimos anos.”
SUCATEAMENTO E ABANDONO
Alexandre lembrou que durante a pandemia, os Correios foram fundamentais para o país, absorvendo um aumento de 42% nas entregas de e-commerce, mesmo com parte do quadro afastado por comorbidades. No entanto, esse período coincidiu com o processo de preparação da empresa para privatização, política iniciada no governo anterior. “Enquanto o comércio eletrônico crescia, os Correios estavam sendo preparados para a venda. E mesmo quando o governo Lula retirou a empresa do pacote de privatizações, nada foi feito para reverter o sucateamento. Pelo contrário, ele se aprofundou.”
Segundo o dirigente, a gestão que assumiu não apresentou um plano consistente de recuperação.
“O presidente indicado não tinha experiência na área postal, e a falta de direção estratégica se reflete no cotidiano. Cada semana surge uma ideia nova — frota elétrica, drones, centro logístico, mas nada sai do papel.”
CRISE SE AGRAVA CADA VEZ MAIS
Para Alexandre, três medidas tomadas pelo próprio Executivo federal foram decisivas para derrubar as receitas da empresa: a alterações no fluxo aduaneiro pela Receita Federal, em 2024; a Portaria 1096 do Ministério da Fazenda, que quebrou a exclusividade dos Correios no transporte internacional de encomendas; e a chamada “PEC das blusinhas”, que reduziu tributos de importações de pequenos pacotes. “Essas foram medidas que retirara, de acordo com a própria empresa, cerca de 1 milhão de objetos por dia dos Correios. É impossível manter o equilíbrio financeiro diante de uma perda desse tamanho. Foram decisões cirúrgicas e devastadoras.”
CONCORRÊNCIA DESLEAL
O sindicalista também alertou para outro ponto que contribuiu fundamentalmente para a situação do Correios, que é a concorrência desleal imposta pelas empresas privadas de logística, que operam com trabalhadores pejotizados. “Essas empresas não seguem a legislação trabalhista. O trabalhador é “dono” do próprio carro, paga combustível, manutenção, e trabalha 12, 14 horas por dia para não perder o roteiro. Isso é superexploração disfarçada de modernidade. E o governo se omite nesse debate.”
Alexandre também criticou a falta de ação do Ministério do Trabalho diante do avanço desse modelo: “Quem deveria chamar essa discussão é o Ministério do Trabalho, porque estão deformando o que sobrou da CLT no Brasil. O STF não é nosso amigo nesse tema, essa é uma responsabilidade do Executivo.”
UM GESTO QUE GEROU INDIGNAÇÃO
Um dos momentos mais duros da entrevista foi a crítica à postura do presidente Lula, que visitou o centro de distribuição do Mercado Livre, em Cajamar (SP), vestindo o jaleco da empresa. “Aquela imagem foi um golpe simbólico para a categoria. O presidente se veste com o uniforme de uma empresa que usa mão de obra precarizada, enquanto ignora os trabalhadores dos Correios, que pedem apenas uma audiência e investimentos. Foi um gesto infeliz e desrespeitoso.”
Alexandre lembrou que os Correios têm presença em quase 490 municípios no Rio Grande do Sul, incluindo pequenas cidades que jamais seriam atendidas por empresas privadas. “Quando se fala em privatização, é preciso perguntar: quem vai garantir o serviço postal nessas cidades onde o fluxo não dá lucro? Essa é a essência do serviço público que o governo precisa defender.”
SITUAÇÃO DE DESPEJO
O sindicalista também denunciou o descumprimento de compromissos da direção da empresa, como a não convocação dos aprovados no concurso público dos Correios, o primeiro desde 2011.
“O concurso foi homologado em fevereiro e até agora nenhuma pessoa foi chamada. São mais de oito mil aprovados. A promessa era iniciar as contratações até dezembro de 2024.”
Além disso, Alexandre relatou que agências estão sendo despejadas por falta de pagamento de aluguel, como o caso de Ivoti (RS), onde trabalhadores foram surpreendidos com caminhões da própria empresa, retirando os móveis da unidade. “Foi vexatório. Cinco meses sem pagamento, acordo judicial descumprido e ordem de despejo. Isso mostra o nível a que chegamos.”
O CORREIOS É UM PATRIMÔNIO PÚBLICO
Antes de encerrar sua fala, o dirigente fez um apelo para que o governo federal e a sociedade voltem a enxergar os Correios como o patrimônio público estratégico que são. “Os Correios só são lembrados quando é para salvar o governo — seja na tragédia das enchentes, seja no atendimento do INSS. Mas fora desses momentos, não há investimento, nem valorização. É preciso um plano nacional para os Correios, com concurso, modernização, valorização dos trabalhadores e defesa da universalidade postal.”
Principalmente a entrevista deixa claro que a crise dos Correios não é fruto da ineficiência dos trabalhadores, mas da falta de política pública, de visão estratégica e da conivência com modelos que precarizam o trabalho e favorecem o capital privado.
Veja abaixo a entrevista na íntegra.
Assessoria de Comunicação
27/10/2025 10:18:56

